4 de março de 2007

Salazar - Recordar ou Reprimir?

Já ouvi e de certeza muitos outros ouviram alguém a manifestar-se com frases do género "No tempo de Salazar não havia disto!" quando vêem algo que não lhes agrada. Maioria das pessoas concordará com a situação que origina tal frase, mas a expressão escolhida já poderá não ser do agrado.

Todos nós temos uma noção do papel de Salazar na história, e a grande maioria vê-o como a personificação de um período negro na democracia portuguesa. Salazar veio novamente à tona não só pela votação para o pior e melhor português, como recentemente sobre a construção de um museu sobre a sua pessoa. Sobre as votações nada tenho a dizer, tem o valor que quisermos dar, mas sobre o museu já não acontece o mesmo.

Eu tenho a tendência (admito) para ver Salazar como a tal personificação do período negro da democracia portuguesa, e digo democracia, não história. Todos somos contra a censura, prisões de quem apenas se manifesta contra o governo, da desconfiança entre familiares, vizinhos, amigos sem saber se eram ou não da PIDE. Mas também lembro-me de ter sido dito nas aulas de História que nesse período, Portugal tinha a sétima maior reserva de ouro, obviamente que falta saber a que custo foi obtida essa reserva. Mas apenas menciono este aspecto para salientar que a herança da governação de Salazar não é completamente negativa. O período em causa sim, mas passámos para uma democracia nova, com a plenitude de direitos a ela inerente, e se hoje dizemos mal do estado do país, de quem é a culpa? Quem é que pode dizer mal de Salazar?

Começemos pela tal reserva de ouro, éramos a 7ª potência, o que aconteceu a essa riqueza? Foram os sucessivos governos a gastar tal riqueza em algo que ninguém reparou (talvez cegos pela nova democracia)? Salazar sabemos que não refugiou-se no estrangeiro com o dinheiro.

Quanto à nova democracia, todos nós ganhámos de volta os direitos perdidos com o Estado Novo, e o que fizemos? Bem, após a "euforia" agora vemos que a participação das pessoas nos destinos à frente do país é cada vez menor; cada vez mais, ouvimos falar de corrupção, desemprego e dificuldades financeiras. Salazar de certeza que não é culpado por esta situação, Por isso repito a questão, quem é que pode dizer mal de Salazar?

De certeza que não são aqueles que abstêm-se de votar, também não serão aqueles que nasceram, digamos a partir dos anos 80, não é discriminação mas só sabem aquilo que lhes foi dito. Sobram aqueles que viveram nesse período e que nasceram nos anos logo a seguir e ainda tiveram tempo de viver a fase de transição para a "plenitude de direitos". Por isso quando vejo/ouço alguém que viveu nesse período a queixar-se da opressão de Salazar, não posso dizer nada contra, mas também não posso dizer nada contra a quem viveu nesse período, que foi preso e torturado pela PIDE, e anos depois ao ver a situação actual do país reconhece que esse período foi um "mal necessário", e esta situação não é fantasia, ninguém contou, vi na televisão a pessoa em causa a falar. Os mais cépticos poderão dizer que se trata do "Sindroma de Estocolmo", eu prefiro pensar que o homem sabe o que está a dizer e que a ele ninguém pode falar mal.

E chegamos ao dia de hoje, passada que foi há uns dias o protesto contra a construção do museu sobre Salazar. Na minha opinião quem se poderia mostrar contra preferiu mostrar-se a favor, e aqueles que não eram afectados na sua vida pelo museu resolveram dar importância a algo que o país mais tarde ou mais cedo vai esquecer.

Por isso, com ou sem museu, devemos recordar ou reprimir Salazar?
Dando já a minha opinião, recordar acredito que significa que, se estamos numa democracia é porque saímos de uma ditadura, e mantém vivo o significado de "dever cívico" das pessoas como por exemplo o voto nas eleições. O reprimir representará o esquecimento, o acomodar das pessoas com o que têem agora, sem contestar o que o governo faz, deixar que outros decidam o seu futuro. A História serve para recordarmos e conhecermos o passado para que não se repita erros. Quanto a manifestações, aqueles que tem "autoridade moral" que expressem a sua opinião, os outros que se calem e que dirijam a sua energia em tornar o seu país e a sua vida melhor sem culpar o passado que pouco conhecem.

3 comentários:

Ana Maia disse...

Salazar é o oposto da democracia. Foi um ditador.
Tinhamos ouro? Quem? Não o povo, seguramente,que morria literalmente à fome.
Foi o responsável por quase 50 anos de obscurantismo, de isolamento do mundo. Nem o espanhol, igualmente ditador e tirano, fez isto a Espanha. Sempre teve uma noção de não afastar Espanha do resto do mundo. Falo, claro, como saberão, de Franco.
Não temos nada, rigorosamente nada, de bem herdado da época de Salazar.
Continuamos atrasados e muito temos de agradecer a esse homem.
Lamento, não consigo ver nos factos, na história, nada de positivo feito por este homem para Portugal.

DRC disse...

Só para esclarecer,

Do ouro eu não disse que o partilhou, levantei mesmo a questão do "preço" desse ouro. Mas que esse ouro depois não foi usado ou foi mal usado é outra questão.

Sobre o tópico em si, a "herança" e o atraso de Portugal, apenas digo doutra maneira que é demasiado fácil culpar apenas Salazar.

O objectivo com que criei o tópico foram dois.
1º - apenas de colocar em causa aqueles que falam de Salazar como se tivessem sofrido na pele mas não sabem de nada.
2º - Que por muito mau/negro que o periodo seja, Portugal não pode esquecer desse período porque senão (e em linha de conta com o tópico anterior) não tarda nada a abstenção passa os 50% consistentemente e volta a ser uma minoria a governar um país. Basta ver o exemplo françês que com tanta displicência que o Le Pen ia sendo eleito; na Áustria há uns anos foi eleito um partido de extrema-direita.

Ana Maia disse...

Ninguém aqui culpou apenas Salazar...é dele que estamos a falar, logo foi sobre ele que falei.

Mais impressão ainda fazem os neo-nazis e amigos de Salazar, que nasceram em liberdade e o defendem como um heroi...isso sim, custa muito.